Receba um pedaço da Caju toda semana.

Inscreva-se na nossa newsletter e receba as principais novidades que o profissional de RH precisa saber para se destacar no mercado.

Leis trabalhistas

Antecedentes criminais na contratação: quando a empresa pode exigir?

A exigência de antecedentes criminais ainda gera dúvidas no RH. Entenda o que diz a lei, quando a prática é permitida e como realizá-la com segurança jurídica e respeito à privacidade dos candidatos.

Criado em

Atualizado em

por Cecilia Alberigi

Leia em 11 minutos

A exigência de antecedentes criminais é um tema que gera dúvidas e controvérsias no meio corporativo. Muitos departamentos de Recursos Humanos se perguntam em qual situação pode solicitar esse documento sem ferir direitos trabalhistas e a privacidade dos candidatos.

De um lado, está a preocupação legítima das empresas com a segurança, a confiança e o risco operacional de determinadas funções. De outro, há princípios constitucionais que garantem a dignidade da pessoa humana e a presunção de inocência.

Neste artigo, vamos explicar o que diz a lei, em quais situações a exigência é permitida, quais são os cuidados que o RH deve adotar e como alinhar esse processo à LGPD e às boas práticas de gestão de pessoas.

O que diz a lei sobre antecedentes criminais na contratação

A CLT não traz um artigo específico sobre o pedido de antecedentes criminais.

Mesmo assim, outras normas e decisões judiciais ajudam a preencher essa lacuna, especialmente a Constituição Federal, a Lei nº 9.029/1995 e o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Direitos garantidos pela Constituição

A Constituição assegura:

  • o direito à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem
  • a presunção de inocência, segundo a qual ninguém é considerado culpado antes de uma condenação definitiva

Com base nesses princípios, entende-se que não é permitido discriminar um candidato por registros criminais, principalmente quando não há sentença final.

O que estabelece a Lei nº 9.029/1995

Essa lei proíbe práticas discriminatórias nas relações de trabalho. Isso significa que uma empresa não pode negar emprego, promoção ou permanência com base em critérios que não tenham relação direta com as atividades do cargo.
O histórico criminal, quando não interfere na execução da função, não deve ser usado como critério de exclusão.

Entendimento do TST

O Tribunal Superior do Trabalho entende que a exigência de antecedentes criminais só é legítima quando existe justificativa real, como em casos de:

  • cargos que exigem alto grau de confiança;
  • funções que envolvem valores, segurança ou dados sensíveis.

Em qualquer outra situação, a exigência é considerada abusiva e pode gerar indenização por danos morais.

Em resumo

  • Pode pedir antecedentes? Sim, mas apenas em situações específicas.
  • Quando é permitido? Quando o cargo exige confiança, segurança ou há previsão legal.
  • Quando é proibido? Quando o pedido não tem relação direta com a função ou pode ser considerado uma forma de discriminação.

Para o RH, a recomendação é clara: avalie se o pedido é realmente necessário e justificável. Caso contrário, a prática pode ser considerada ilegal.

Em quais casos a exigência de antecedentes criminais é permitida

A exigência é considerada lícita e proporcional quando existe uma relação direta entre a função exercida e a necessidade de segurança, sigilo ou confiança.

A seguir, veja as principais situações reconhecidas pela jurisprudência e pela legislação brasileira.

Quadro comparativo – Exigência de antecedentes criminais pela empresa

Situações em que a exigência é permitidaSituações em que a exigência é proibida / arriscada
Cargos que envolvem segurança pública ou vigilância armadaProcessos seletivos em geral sem justificativa legal
Funções com transporte de valores (ex.: carro-forte)Vagas administrativas, operacionais ou de escritório
Atividades com contato direto com crianças, adolescentes ou idososExigir antecedentes como critério eliminatório sem relação com a função
Funções de confiança ou sensíveis (ex.: motoristas de carga, aeroportos, banco de dados sigilosos)Solicitar o documento sem informar a finalidade ou sem consentimento
Determinação prevista em lei específica ou convenção coletivaExigir antecedentes em massa para todos os colaboradores

Cargos que envolvem segurança pública ou vigilância armada

Profissionais que atuam com proteção de pessoas, transporte de valores, segurança patrimonial ou escolta armada podem ter a exigência de antecedentes criminais prevista em lei.

Isso está descrito na Lei nº 14.967/2024, que regula as atividades de segurança privada em todo o país.

Funções que exigem alto grau de confiança

Motoristas de carga, bancários, vigilantes, funcionários de aeroportos e profissionais que lidam com informações sigilosas ou recursos financeiros também se enquadram nessa categoria.

Nessas funções, a empresa deve zelar pela integridade dos dados, valores e pessoas sob sua responsabilidade.

Atividades com contato direto com crianças, adolescentes ou idosos

Cuidadores, professores, motoristas escolares e empregados domésticos podem ter antecedentes exigidos.

O objetivo é garantir a segurança de pessoas vulneráveis e prevenir riscos de abuso, violência ou negligência.

Situações previstas em lei específica ou convenção coletiva

Determinadas categorias profissionais têm essa exigência formalizada em normas coletivas ou legislações setoriais.

Nesse caso, o empregador deve manter a documentação que comprove a obrigatoriedade e justificar o tratamento de dados.

Principais riscos e cuidados para o RH

Mesmo quando existe justificativa, o pedido de antecedentes criminais deve seguir protocolos rigorosos para não gerar riscos legais, éticos e de imagem.

Risco de discriminação e ações trabalhistas

A exigência indevida pode configurar ato discriminatório e gerar até mesmo indenização por danos morais.

Isso ocorre, por exemplo, quando a empresa elimina candidatos com base em antecedentes sem relação com o cargo, ou quando trata de forma desigual pessoas que possuem registros antigos ou irrelevantes.

O Ministério Público do Trabalho (MPT) considera a prática abusiva se não houver justificativa técnica. Em casos mais graves, o MPT pode ajuizar ações civis públicas contra empresas, exigindo reparação e ajustes em seus processos seletivos.

Violação à privacidade e à LGPD

A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) classifica os antecedentes criminais como dados pessoais sensíveis. Isso significa que o tratamento dessas informações exige base legal específica, consentimento do titular e finalidade legítima.

De acordo com o artigo 11 da LGPD, o RH deve:

  • Coletar e armazenar os dados apenas com consentimento expresso do candidato;
  • Informar claramente a finalidade do pedido;
  • Garantir sigilo e acesso restrito às informações;
  • Excluir o documento após o término do processo seletivo, se não houver contratação;
  • Registrar todas as etapas para fins de compliance.

Ignorar essas obrigações pode gerar sanções pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), além de danos à reputação da empresa.

Impactos na marca empregadora

Além dos aspectos legais, a exigência indevida de antecedentes pode prejudicar a imagem da empresa no mercado. Práticas discriminatórias enfraquecem a marca empregadora, afastam talentos e vão na contramão das tendências de diversidade e inclusão.

Empresas que valorizam transparência, equidade e respeito à privacidade são mais bem vistas por candidatos, parceiros e clientes.

Boas práticas para empresas modernas

A cultura de compliance não deve se limitar ao cumprimento da lei, ela deve refletir o compromisso ético da organização.

Confira algumas boas práticas recomendadas para empresas que desejam agir de forma responsável.

1. Avaliar a real necessidade

Antes de solicitar o documento, o RH deve avaliar se há nexo direto entre as responsabilidades do cargo e a necessidade de segurança.

Quando não houver esse vínculo, é preferível substituir o critério por métodos objetivos, como testes técnicos, entrevistas estruturadas e avaliações de perfil.

2. Registrar a justificativa

A empresa deve manter registro formal que comprove o motivo da exigência, seja uma lei específica, uma convenção coletiva ou uma análise de risco da função.

Esse registro é essencial para demonstrar boa-fé em caso de auditoria, denúncia ou processo judicial.

3. Respeitar a LGPD em todas as etapas

Os dados coletados durante o processo seletivo são de responsabilidade do controlador, que normalmente é a empresa contratante. 

Portanto, é fundamental implementar políticas internas de privacidade e treinar o time de RH para o tratamento correto de informações sensíveis.

4. Evitar generalizações

Solicitar antecedentes em massa, para todas as vagas, é uma prática que pode ser muito arriscada.

Além de violar o princípio da proporcionalidade, demonstra falta de critério e de sensibilidade jurídica. Cada caso deve ser analisado de forma individualizada.

5. Adotar políticas de inclusão

Empresas modernas têm valorizado a reinserção social de pessoas egressas do sistema prisional, oferecendo oportunidades com base em mérito e potencial.

Essa postura fortalece a cultura de responsabilidade social e contribui para reduzir desigualdades.

Como o candidato deve agir diante de exigência abusiva

Quando uma empresa exige antecedentes criminais sem justificativa, o candidato tem o direito de se proteger e agir de forma consciente. Abaixo estão as principais orientações para lidar com esse tipo de situação.

Solicitar esclarecimentos

O primeiro passo é pedir que a empresa explique a razão do pedido. É importante entender qual é a finalidade da exigência e se existe base legal que a ampare.

Caso a empresa não saiba justificar, o candidato já tem um indício de que a prática pode ser irregular. Essa abordagem também demonstra postura profissional e conhecimento dos próprios direitos.

Recusar o fornecimento do documento

Se não houver uma justificativa clara ou prevista em lei, o candidato pode recusar a entrega da certidão de antecedentes criminais. Essa recusa não pode ser usada como motivo para desclassificação no processo seletivo.

A apresentação do documento só deve ocorrer quando houver relação direta entre o cargo e o histórico criminal, como nas áreas de segurança, transporte de valores ou vigilância.

Registrar denúncia ao MPT

O Ministério Público do Trabalho (MPT) é o órgão responsável por fiscalizar práticas discriminatórias no ambiente de trabalho.

Caso o candidato identifique abuso, ele pode registrar uma denúncia anônima ou formal. O MPT pode instaurar uma investigação e, se necessário, propor ações contra a empresa para garantir o cumprimento da lei.

Buscar assistência jurídica

Em situações mais graves, é recomendável buscar apoio jurídico especializado, inclusive junto à Defensoria Pública, que oferece atendimento gratuito.

Um advogado trabalhista pode orientar sobre os direitos violados, reunir provas e conduzir um eventual processo judicial. Ter apoio legal aumenta as chances de reparação e evita que o trabalhador sofra novas formas de discriminação.

Guardar provas da exigência indevida

Mensagens, e-mails, formulários ou prints de tela que comprovem o pedido indevido devem ser guardados com cuidado. Esses registros são fundamentais para demonstrar que houve uma exigência sem respaldo legal.

Em casos de ação judicial, as provas podem reforçar a argumentação e fundamentar um pedido de indenização.

Como a LGPD reforça a proteção dos candidatos

A Lei nº 13.709/2018, que entrou em vigor em 2020, trouxe mudanças profundas para os processos de admissão.

Segundo a LGPD, o tratamento de dados pessoais, especialmente os sensíveis, como antecedentes criminais, deve seguir os princípios de:

  • Finalidade: uso apenas para propósitos legítimos e específicos;
  • Adequação: compatibilidade entre o tratamento e o propósito informado;
  • Necessidade: coleta mínima de dados necessários;
  • Segurança: uso de medidas técnicas e administrativas para proteção;
  • Prestação de contas: capacidade de demonstrar conformidade.

Na prática, isso significa que o RH precisa documentar cada etapa do processo e garantir que as informações não sejam usadas para discriminação, exclusão indevida ou decisões automatizadas.

O papel da reinserção social e da responsabilidade corporativa

Negar emprego com base em antecedentes criminais antigos ou irrelevantes vai contra um dos fundamentos do sistema penal: a ressocialização.

Uma pessoa que cumpriu sua pena e busca uma nova oportunidade tem direito de reconstruir a vida profissional.

Diversas empresas já aderiram a programas de inclusão de egressos do sistema prisional, com resultados positivos de produtividade e engajamento. Essa prática reforça a imagem institucional e contribui para a redução da reincidência criminal.

Adotar políticas de segunda chance, com suporte de ONGs e iniciativas públicas, é uma forma concreta de aplicar valores de ESG e responsabilidade social corporativa.

Conclusão

Exigir antecedentes criminais pode ser legítimo em alguns casos, mas é sempre uma decisão que exige cautela, proporcionalidade e embasamento jurídico.

A ausência de critérios claros pode transformar uma medida de segurança em uma violação de direitos.

Empresas que agem com responsabilidade e transparência protegem não apenas seus colaboradores, mas também sua própria reputação.

Para o RH, o desafio é equilibrar segurança e inclusão, adotando políticas que respeitem a legislação e promovam a confiança mútua.

Com o apoio da tecnologia e de práticas modernas de compliance, é possível conduzir processos seletivos mais éticos, seguros e alinhados à LGPD, fortalecendo uma cultura organizacional baseada em respeito e justiça. Quer ficar por dentro das melhores práticas para RH e DP? Continue acompanhando o blog da Caju e veja como transformar a gestão de pessoas com inovação e responsabilidade.

Conheça a Caju

Preencha o formulário de interesse abaixo.

Entraremos em contato com as melhores soluções para sua empresa.

Compartilhe nas redes sociais

Cecilia Alberigi

Sou jornalista, publicitária e viajante nas horas vagas. Na Caju, minha missão é transformar textos complexos em conteúdos claros, acessíveis e que façam sentido para quem me lê. Acredito que a flexibilidade é fundamental em todos os aspectos da vida, por isso valorizo a liberdade de adaptação, tanto no trabalho quanto no cotidiano.

Ver todos os posts dessa autoria

Receba um pedaço da Caju toda semana.

Inscreva-se na nossa newsletter e receba as principais novidades que o profissional de RH precisa saber para se destacar no mercado.